por Miguel A. Valdivia
Se você perguntasse às pessoas ao seu redor sobre a arca da aliança, provavelmente ouviria uma referência a Caçadores da Arca Perdida - o filme de 1981 estrelado por Harrison Ford. Se seu público for mais jovem, essa conexão com a cultura pop talvez nem apareça em sua conversa. Mas a caixa dourada ladeada por anjos tem um significado muito mais profundo do que o retratado no filme.
De acordo com a Bíblia, a arca da aliança era uma peça de mobília localizada no compartimento mais interno do antigo tabernáculo dos israelitas, erguido no deserto após a fuga do Egito na época de Moisés. Era tão sagrado que aqueles que o profanavam eram punidos ou milagrosamente mortos (2 Samuel 6:6, 7). Provavelmente, foi isso que inspirou a destruição final, carregada de efeitos especiais, desencadeada pela arca no filme.
Entre aqueles que reconhecem a origem bíblica da arca da aliança, é provável que a maioria a associe a antigos rituais judaicos, que têm pouca aplicação na vida do século XXI. Mas eles estariam perdendo o extraordinário significado do santuário e como ele ilumina nossa compreensão de Deus e Seu plano de salvação. Vamos dar uma olhada mais de perto nesse rico tópico.
Comunhão com Deus
Primeiro, vamos estipular que a natureza humana tem uma necessidade inata de adorar. Não é preciso ser sociólogo para notar a presença de práticas religiosas em praticamente todas as culturas, desde os aborígenes australianos até os nativos americanos, os habitantes das ilhas do Pacífico e os do Oriente Médio. A humanidade também precisa de uma forma de adoração.
A Bíblia ensina que Deus se comunicou com Adão e Eva no Jardim do Éden e, desde que os seres humanos traíram esse relacionamento, Deus e o homem têm procurado maneiras de se reaproximar. Encontramos uma tentativa de fazer as pazes com Deus já na história dos sacrifícios feitos pelos dois primeiros irmãos, Caim e Abel (Gênesis 4:2-5). Os patriarcas construíram altares para Deus. Abraão estava disposto a sacrificar seu próprio filho Isaque até que o próprio Deus providenciou um carneiro (Gênesis 22:1-18).
Mais tarde, Deus orientou os israelitas a construírem um lugar para a comunhão com Ele. “E façam para mim um santuário, para que eu habite no meio deles” (Êxodo 25:8, KJA). Ele não apenas lhes disse para construí-lo, mas também deu instruções detalhadas para sua construção e para os serviços a serem realizados ali. (Você pode ler essas instruções nos capítulos 25 a 39 de Êxodo e nos livros de Levítico e Números).
Em toda a Bíblia, vemos a história da jornada da humanidade para restaurar o relacionamento com Deus. Ao descrever o santuário, a Bíblia explica que foi Deus quem tomou a iniciativa de tornar esse relacionamento completo novamente. Então, vamos aprender mais sobre o santuário.
Como era o santuário israelita?
As instruções recebidas por Moisés descreviam um edifício móvel estruturado com varas e coberto com uma tenda feita de pelo de cabra, com peles de animais por cima. Ele tinha 43 pés e 9 polegadas por 14 pés e 7 polegadas, com dois compartimentos separados por cortinas. O compartimento da frente, o “Lugar Santo”, tinha 29 pés, 2 polegadas por 14 pés, 7 polegadas, e o segundo compartimento, o “Lugar Santíssimo”, tinha um quadrado de 14 pés, 7 polegadas por lado.*
Se você tivesse o privilégio de ver o santuário ou tabernáculo dos israelitas hoje, provavelmente não ficaria impressionado com seu tamanho ou aparência externa, mas isso não seria verdade em relação ao interior. Ele tinha cortinas de ouro, azul e escarlate bordadas com querubins de ouro. Também tinha várias peças de mobília feitas de ouro puro ou cobertas de ouro. É claro que a mensagem mais profunda do santuário não estava expressa em sua aparência, mas nos serviços que eram realizados ali.
Deus deu instruções detalhadas sobre os serviços e os funcionários que serviam no santuário. Arão, irmão de Moisés, foi o primeiro sumo sacerdote (Êxodo 28:1), o sacerdote de mais alto nível selecionado da tribo de Levi, que era um dos 12 filhos de Jacó, que era filho de Isaque, que era filho de Abraão - o pai da nação hebraica.
A mensagem nos serviços do santuário
Em poucas palavras, o santuário revelava o plano de salvação de Deus. Seus rituais representavam o caminho para Deus e Seu perdão.
Os serviços do santuário incluíam regularmente várias categorias de sacrifícios de animais, como ofertas de paz, ofertas pelo pecado e ofertas de consagração. Havia holocaustos diários e ofertas acessórias, e havia ofertas especiais ligadas a celebrações anuais, como a Páscoa, a Festa dos Pães Ázimos, o Pentecostes e o Dia da Expiação (que os judeus hoje observam usando o nome hebraico Yom Kippur).
O sacrifício geralmente era feito da seguinte forma: O pecador colocava as mãos sobre a cabeça do animal e o matava. O sacerdote coletava o sangue e o aspergia sobre o altar (uma estrutura quadrada de madeira queimada com uma grade de bronze e um chifre de bronze esculpido em cada canto). O pecador esfolava e cortava o animal, e os sacerdotes alimentavam o fogo e colocavam pedaços do animal sobre a grade de metal. O sacrifício era totalmente consumido no altar (Levítico 1:3-13).
Essa matança contínua de animais e a aspersão de seu sangue sobre o altar podem ofender nossa sensibilidade atual, mas para uma sociedade agrícola e nômade da Idade do Bronze, isso mostrava a clara conexão entre pecado e morte. Agir de forma desamorosa, odiosa ou sem consideração para com outros seres humanos causava o fim de uma vida.
Outra lição importante dos serviços do santuário é que a salvação só é possível por meio da transferência de nosso pecado para Cristo, nosso substituto. Esse é um conceito difícil de ser compreendido pela mente, mas está no centro do plano de salvação de Deus. O princípio é que não podemos nos salvar. Nosso DNA está repleto de tendências pecaminosas. Nosso coração é egoísta. Somos, por natureza e herança, inimigos de Deus. Em termos bíblicos, somos todos pecadores (veja Romanos 3:23). Paulo resume o que é, de fato, a mensagem do santuário desta forma: “O salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Romanos 6:23).
O sacrifício de animais que ocorria no santuário era simbólico; o sangue de animais não tem poder algum para nos trazer salvação. Quando os israelitas perderam de vista a mensagem de salvação e começaram a sacrificar os animais como pagamento pelo privilégio de pecar, Deus lhes enviou uma mensagem por meio do profeta Isaías:
“A multidão de seus sacrifícios o que são eles para mim?", diz o SENHOR.
“Tenho mais do que o suficiente de holocaustos,
de carneiros e da gordura de animais engordados;
Não tenho prazer no sangue de touros, de cordeiros e de bodes” (Isaías 1:11).
O que o santuário e seu serviço faziam era revelar de maneira muito clara a gravidade do pecado, a necessidade de confissão, a santidade de Deus e Sua intervenção na história humana para abrir um caminho de salvação para todos nós. Sim, a cultura pop e as ciências sociais podem denunciar a religião como uma relíquia ultrapassada das gerações passadas, mas a realidade é que a psicologia humana tem dificuldade em fornecer uma solução para a culpa, a desesperança e o significado de nossas vidas.
Símbolos com profundo significado
O santuário nos ensina as boas novas do evangelho em sua forma primitiva. Os principais componentes do serviço do santuário eram o sacerdote, o altar de sacrifícios, os animais sacrificados, a bacia de bronze, os pães da proposição, a menorá (candelabro de sete braços), o altar de incenso e a arca da aliança. Esses símbolos representam as realidades da salvação:
Jesus é nosso Sacerdote, que opera nossa salvação perante o universo. Ele é o Cordeiro de Deus, o único sacrifício verdadeiro e completo por nossos pecados. Jesus é o Pão da Vida e a Luz do mundo. Suas palavras são como incenso perfumado que se eleva à presença do Pai com as orações de Seu povo.
Por meio de seus símbolos, o santuário falava de realidades que transcendiam seu momento na história. O Novo Testamento mostra que Jesus é a Pessoa central no plano de salvação, que o santuário representava. O livro de Hebreus traz a questão à tona quando nos diz: “Portanto, visto que temos um grande sumo sacerdote que subiu aos céus, Jesus, o Filho de Deus, apeguemo-nos firmemente à fé que professamos. Pois não temos um sumo sacerdote que não é capaz de sentir empatia por nossas fraquezas, mas temos alguém que foi tentado em todos os sentidos, assim como nós, mas não pecou. Aproximemo-nos, pois, confiadamente do trono da graça de Deus, a fim de recebermos misericórdia e encontrarmos graça que nos ajude em nossos momentos de necessidade” (Hebreus 4:14-16).
A mensagem continua viva
Essas palavras em Hebreus mostram como a mensagem do santuário deve continuar viva em nossa experiência religiosa hoje. Temos um sacerdote celestial. Não precisamos de sacerdotes terrenos. A Bíblia é muito clara quanto a isso: “Porque há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem, o qual se deu a si mesmo em resgate por todos os homens” (1 Timóteo 2:5, 6). Quando O reivindicamos como nosso Salvador, Ele nos leva com Ele à presença do Pai, algo que somente o sumo sacerdote do santuário terrestre tinha permissão de fazer uma vez por ano. Lá, na presença de Deus, temos a certeza de encontrar misericórdia e graça “em nossos momentos de necessidade”.
A igreja cristã é chamada a manter Cristo no centro da adoração. Cada sermão e cada evento deve apontar para o “Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo” (João 1:29). O caminho para a salvação passa pelo Calvário, o lugar onde ocorreu o sacrifício final por nossos pecados. Essa verdade não é complicada. A Bíblia diz: “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1 João 1:9). E João adota um tom paternal quando escreve no capítulo seguinte: “Meus queridos filhos, escrevo-lhes isto para que vocês não pequem. Mas, se alguém pecar, temos um Advogado junto ao Pai: Jesus Cristo, o Justo. Ele é o sacrifício expiatório pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos pecados do mundo inteiro” (1 João 2:1, 2).
No santuário, Deus abriu negociações para a paz entre Ele e nós. Sua oferta ainda está de pé. Você aceitará Suas condições?
Miguel A. Valdivia é pastor e administrador da Pacific Press® Publishing Association. Ele escreve de Nampa, Idaho.
* Francis D. Nichol, ed., The Seventh-day Adventist Bible Commentary, vol. 1 (Washington, DC: Review and Herald®, 1976), 696-710.